Falta de chuva provoca violência
Os confrontos que resultam da falta de chuvas em algumas regiões costeiras da província da Zambézia, nomeadamente Quelimane, Nicoadala e Namacurra já produziram três mortos, doze feridos, cinco dos quais agentes da corporação policial e um elevado número de desalojados que continuam ainda ao relento.
As acusações de “amarrar chuva” em regiões como Quelimane, Maquival, Ionge, Namacata no distrito de Nicoadala e Macuse, Mixixine, Forquia, em Namacurra, não são novas, só que este ano a situação atingiu contornos criminais jamais vistos na história da província da Zambézia.
Se não chove é porque alguém “amarrou” a chuva e esse alguém só deve ser aquele que num momento de seca tem uma vida mais desafogada. Este é, pelo menos, o senso comum das pessoas entrevistadas pela nossa Reportagem em Mixixine, em Namacurra, Maquival e Zalala, em Nicoadala, Micajune e Namuinho, na cidade de Quelimane. Todas as vítimas ou acusados de prenderem a chuva são empreendedores que com sacrifício e trabalho abnegado, trabalhando debaixo do sol escaldante, brotando suor dos seus corpos procuraram melhorar as suas vidas e das suas famílias. Uns vendem aguardente de fabrico caseiro, transportada para Quelimane e no seu regresso levam de volta produtos como leite, bolachas, capulanas, óleo alimentar, entre outros, para revenderem nas suas bancas fixas. É assim que vão lutando de forma honesta pela vida, como é o caso de Henrique Manuel, em Mixixine, que viu as suas duas casas queimadas injustamente devido à fúria de populares que acusam-no de “prender” chuva só porque tem braços para trabalhar e cabeça para pensar.
Os nossos entrevistados alegam que Henrique Manuel tem amarrado a chuva como forma de os populares locais não terem recursos de sobrevivência e assim recorrerem aos seus produtos. Entendem ainda que assim ele fará sempre lucros fabulosos a custo do sofrimento de outros que nas suas machambas não têm água para cultivarem o arroz.
A percepção popular do assunto parece dogmática, pois não se pode questionar muito das provas que os declarantes têm para acusar terceiros. Quando a nossa Reportagem questionou Domingos Luciano, em Mixixine, este chegou a acusar a nossa Reportagem de estar “juntos” com aqueles que prendem a chuva. “Nós sabemos, porque nós somos daqui e conhecemos os malandros”, sentenciou o nosso entrevistado perante a ovação de outros que no momento do inquérito rodeavam o repórter.
Há neste momento uma crença bastante forte nas comunidades de que é possível que alguém dotado de poderes mágicos possa impedir a chuva. Esta maneira de pensar é própria de comunidades que continuam ainda amarradas ao obscurantismo e bruxaria. É como se essas comunidades não tivessem evoluído e continuam a pensar de uma forma arcaica.
17 Fevereiro 2009 12:24
2 comentários:
Nasci, cresci e vivi em Quelimane até ao ano de 1975 e é com profunda tristeza que constato essa maneira de pensar tão ... mítico-religiosa, tão pré-racional.
Como é possível, em pleno século XXI, pensar-se assim?
Um dos problemas de Moçambique pode muito bem ser um problema de mentalidades.
O poder político tem que apostar mais no sector da educação e no conhecimento, nomeadamente no conhecimento científico.
Esse será o caminho do futuro.
Carlos Silva
Para melhor compreender o fenómeno veja o blog do prof Carlos Serra em http://oficinadesociologia.blogspot.com/
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